Die fröhliche Wissenschaft Friedrich Wilhelm Nietzsche (1881) | |||
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A Gaia Ciência | The Joyful Wisdom ("La Gaya Scienza") | ||
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Talvez não baste somente um prólogo para este livro; e, afinal, restaria sempre a dúvida de que alguém que não tenha vivido algo semelhante possa familiarizar-se com a vivência deste livro mediante prólogos. Ele parece escrito na linguagem do vento que dissolve a neve: nele há petulância, inquietude, contradição, atmosfera de abril, de maneira que continuamente somos lembrados tanto da proximidade do inverno como da vitória sobre o inverno, a qual virá, tem de vir, talvez já tenha vindo... A gratidão aí emana sem parar, como se tivesse ocorrido o mais inesperado, a gratidão de um convalescente — pois a convalescença era esse inesperado. “Gaia ciência”: ou seja, as saturnais de um espírito que pacientemente resistiu a uma longa, terrível pressão — pacientemente, severa e friamente, sem sujeitar-se, mas sem ter esperança —, e que repentinamente é acometido pela esperança, pela esperança de saúde, pela embriaguez da convalescença. Não surpreende que então venha à luz muita coisa irracional e tola, muita leviana ternura, esbanjada até mesmo em problemas de pelos hirtos e pouco dispostos a deixar-se acariciar e atrair. Todo este livro não é senão divertimento após demorada privação e impotência, o júbilo da força que retorna, da renascida fé num amanhã e no depois de amanhã, do repentino sentimento e pressentimento de um futuro, de aventuras próximas, de mares novamente abertos, de metas novamente admitidas, novamente acreditadas. E quantas coisas não deixei para trás! Esse quê de deserto, exaustão, descrença, enregelamento na própria juventude, essa velhice interposta no lugar errado, essa tirania da dor, superada ainda pela tirania do orgulho que rejeitou as consequências da dor — e consequências são consolos —, esse radical isolamento para se resguardar de um desprezo aos homens que se tornara morbidamente clarividente, essa fundamental limitação ao que é amargo, acre, doloroso no conhecimento, prescrita pela náusea que pouco a pouco nasceu de uma incauta e complacente dieta espiritual — a que chamam de Romantismo —, quem poderia experimentar tudo isso como eu fiz? Mas quem o fizesse me perdoaria certamente mais que um pouco de tolice, desenvoltura, “gaia ciência” — por exemplo, o punhado de canções que agora vêm juntadas a este livro — canções nas quais um poeta, de maneira dificilmente perdoável, zomba de todos os poetas. — Ah, não é apenas nos poetas e seus belos “sentimentos líricos” que este ressuscitado precisa dar vazão a sua malícia: quem sabe que vítima ele não está procurando, que monstruoso tema de paródia o estimulará em breve? “ Incipit tragoedia” [A tragédia começa] — diz o final deste livro perigosamente inofensivo: tenham cautela! Alguma coisa sobremaneira ruim e maldosa se anuncia: incipit parodia, não há dúvida... | Perhaps more than one preface would be necessary for this book; and after all it might still be doubtful whether any one could be brought nearer to the _experiences_ in it by means of prefaces, without having himself experienced something similar. It seems to be written in the language of the thawing-wind: there is wantonness, restlessness, contradiction and April-weather in it; so that one is as constantly reminded of the proximity of winter as of the _victory_ over it: the victory which is coming, which must come, which has perhaps already come.... Gratitude continually flows forth, as if the most unexpected thing had happened, the gratitude of a convalescent—for _convalescence_ was this most unexpected thing. "Joyful Wisdom": that implies the Saturnalia of a spirit which has patiently withstood a long, frightful pressure—patiently, strenuously, impassionately, without submitting, but without hope—and which is now suddenly o'erpowered with hope, the hope of health, the _intoxication_ of convalescence. What wonder that much that is unreasonable and foolish thereby comes to light: much wanton tenderness expended even on problems which have a prickly hide, and are not therefore fit to be fondled and allured. The whole book is really nothing but a revel after long privation and impotence: the frolicking of returning energy, of newly awakened belief in a to-morrow and after-to-morrow; of sudden sentience and prescience of a future, of near adventures, of seas open once more, and aims once more permitted and believed in. And what was now all behind me! This track of desert, exhaustion, unbelief, and frigidity in the midst of youth, this advent of grey hairs at the wrong time, this tyranny of pain, surpassed, however, by the tyranny of pride which repudiated the _consequences_ of pain—and consequences are comforts,—this radical isolation, as defence against the contempt of mankind become morbidly clairvoyant, this restriction upon principle to all that is bitter, sharp, and painful in knowledge, as prescribed by the _disgust_ which had gradually resulted from imprudent spiritual diet and pampering—it is called Romanticism,—oh, who could realise all those feelings of mine! He, however, who could do so would certainly forgive me everything, and more than a little folly, boisterousness and "Joyful Wisdom"—for example, the handful of songs which are given along with the book on this occasion,—songs in which a poet makes merry over all poets in a way not easily pardoned.—Alas, it is not only on the poets and their fine "lyrical sentiments" that this reconvalescent must vent his malignity: who knows what kind of victim he seeks, what kind of monster of material for parody will allure him ere long? _Incipit tragœdia_, it is said at the conclusion of this seriously frivolous book; let people be on their guard! Something or other extraordinarily bad and wicked announces itself: _incipit parodia_, there is no doubt... | ||
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